Dia 11 de março fez um ano que a OMS (Organização Mundial de Saúde) declarou a realidade da Pandemia.
Como se percebe, após 365 dias vivenciando este processo?
Da minha parte, quando avalio o que estamos vivendo, percebo ‘fases' e ‘faces’, dentro e fora de mim. Pandemia não me parece se resumir aos fatos isolamento, contaminação (ou não), vacina, politicagem, etc.. Defino-a muito mais como resgate, despertamento, convite, reavaliação e possível mudança.
Sim, na vivência concreta os primeiros quesitos são os mais perceptíveis, porém vou botar a lente no que me parece ser o mais profundo da experiência. Vasculhar alguns porquês e possibilidades…
Para mim, o vírus é caminho, ferramenta e não o ponto central da experiência.
Ou seja, não se trata de erradicar a pandemia, exterminar o vírus, extirpar a contaminação e retomarmos a vida na sua “normalidade”, mas fazer e refazer a pergunta que não sai da minha mente:
“O que preciso perceber, aqui?” ou, ainda: “O que me cabe mudar?”
Verdade que posso e devo olhar para as questões do coletivo: desigualdade social, demandas emocionais em todas as camadas, uso indevido de recursos e muito mais. Porém, destes temas coletivos, no que posso realmente ajudar? O que me cabe fazer? O que ainda não enxergo em mim mas percebo lá fora?
O mundo, a realidade se apresenta como o resultado de um "projetor gigante”, que mostra no exterior, na tela da Vida, o que cada sujeito possui em si, seja sombra ou luz, valores ou defeitos, harmonia ou desequilíbrio.
Tudo o que É encontra na gênese de si mesma a soma e a atuação constante de todos os personagens do palco terrestre. E as experiências nos convidam a outros caminhos.
Hoje já sei que tudo o que percebo lá fora está também em mim… seja lá em qual grau, forma ou intensidade for.
Sim, tenho os pesadelos e sonhos na alma. E o vírus me chega como um catalisador, um acelerador dos meus processos internos de reconhecimento, aceitação e (talvez) mudança.
Enfim, nestes 365 dias, o que percebi, decidi e mudei?
Primeiramente minha agenda. Não existia brecha para coisas fundamentais, como, por exemplo, o autocuidado. E, como fica uma terapeuta, uma cuidadora que não se cuida? Oras, doente! Isso para não dizer, "uma doente hipócrita”…
Alguns podem dizer: Ah.. mas o mundo precisa, Claudia…! Sim, o mundo precisa… mas somente daquilo que EU TENHO para dar. Quando ofereço do que não tenho, surge o desequilíbrio.
Então, no auge da minha experiência com o COVID, na primeira internação e quase-morte, a decisão: “Vou andar mais devagar”.
E assim estou caminhando… mais devagar, podendo ver a paisagem com mais atenção e conexão. Podendo escutar a minha alma, o meu corpo, a Vida.
O que mais? Diante da emoção básica do medo, ainda naquela primeira fase, a pergunta: “Isso vai me congelar, destruir ou transformar?”
Foi quando, mesmo com frio na barriga e muitas dores no corpo, decidi cantar. Isso mesmo, cantar… e dizer sim aos sintomas. Falar com o corpo…
Contei para ele o quanto sou grata por ser exatamente como é. Por perceber sua força, sua luta e seu empenho ininterrupto por homeostase.
Meu Deus, como é lindo ver esse processo!
Mais que isso.. como é especial perceber o valor da saúde e do cuidado com essa máquina maravilhosa!
Então, de lá para cá cuido e converso mentalmente com minhas células, com meus órgãos e sistemas. Percebo os sinais e “respiro” neles. Sinto caminhos. E meu corpo responde…
Também me dei conta dos pequenos cantinhos da minha casa, dos detalhes a serem mudados e das grandes reformas que seriam necessárias.
Separar o que estava em desuso, admitir que preciso de menos, bem menos. Pintar, dar cor, desenhar… trazer flores e arte para a casa. Música e paz.
Nas relações percebi que já não me cabe engrossar o caldo dos amedrontados, dos reclamantes, dos injuriados. Levar o meio copo cheio, o outro lado da moeda, a possibilidade ainda não percebida. Se virei uma otimista cega? Bom, isso não sei, mas te confesso que me sinto bem e não diminuí em nada minha compaixão ou ajuda.
Junto ao Sagrado só fiz reafirmar e aprofundar ainda mais minha relação. Quem me conhece já sabe que este setor (espiritualidade) sempre fez sentido para mim, desde o tempo em que minha memória é capaz de alcançar. E assim sigo, mais conectada que nunca.
Na cozinha o resgate do prazer de cozinhar todos os dias para mim e minha família.
Se tem dias em que as emoções são difíceis? Claro! Mas são excessão, não regra. Não me demoro nisso. Nem na alegria onde não cabe, tampouco no desespero.
Se já filtrava notícias e programas, agora repasso na peneira, ficando somente com o necessário. Filmes e documentários que agregam, sim. Repetição do lodo, não.
Indignação surge, claro, mas sem me tirar do equilíbrio.
Percepção do ruim somente para trabalhar no bem, não para espumar de ódio.
Neste tempo - entre janeiro de 2020 e março de 2021 - vivi o luto pela morte da minha mãe, minha jornada com o coronavírus, alteração na forma do meu trabalho, sintomas mensais do pós covid, reforma da casa (morando nela). Também acompanhei dor e sofrimento de muitos amigos, pacientes e familiares. Orei e estou orando muito, meditando, falando em lives e em textos.
Ou seja, estou VIVENDO, no meio da crise, apesar da crise e por conta da crise.
Meus queridos, essa é a minha percepção de como tem sido, até aqui. Certamente tenho mais a trabalhar, interna e externamente. Mas.. um passo por vez. Como disse o Mestre: “A cada dia já basta a própria dificuldade…” (Mateus, 6:34)
O que acho que temos pela frente? Não sei. Só sei que, seja lá o que for e como for, temos força para ultrapassar e sairmos melhores disso tudo.
Com trabalho e a percepção de que há um Sentido Maior, sigo.
É isso.
Fantástico texto, como é possível 'um bichinho' fazer tanta reviravolta na gente, fazer com que a gente parasse para agradecer a vida, o mundo etc,. Gratidão Cláudia